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Mais filhos

Às vezes penso que adorava ter mais filhos.

São momento de insanidade, eu sei, depois passam... acho que enlouquecia se tivesse mais uma criança a cargo neste momento. Mas por outro lado o apelo da maternidade ainda por aqui mora. Mas para isso teria que ter outra vida, literalmente outra vida, clonar-me talvez fosse uma opção... 

Enfim, enquanto o nosso país se deixa arrastar para o abismo e tenta finalmente, mas só agora, reagir à baixíssima taxa de natalidade que temos, há empresas que cá em Portugal, sim cá em PORTUGAL, já o fazem há algum tempo.

Não deixem de ver a reportagem da TVI sobre estes bons exemplos.





Manif

Nunca em toda a minha vida fui a uma manifestação. Nunca calhou, nunca me senti tão envolvida numa causa que me apetecesse ir para rua lutar por ela dessa forma.

Mas a verdade é que no sábado só não vou à manifestação "Que lixe a Troika" porque não posso sair de casa. Não concordo com o nome da manifestação, mas concordo com o seu propósito.

Neste momento é essencial que este país de brandos costumes se faça ouvir. Vemos os nossos ordenados ao fim do mês a diminuir; vemos os nossos amigos a perderem os empregos. Deixámos de perceber se existe uma luz ao fundo do túnel  e perder a esperança é sempre o pior que pode acontecer.

Se no sábado algum de vós for, por favor que me represente!

Broken Doll

Entrei nos Correios, a MR correu para os livros infantis dizendo:


- "Mãe, óia! Livros!"

Aproximámo-nos da estante e imediatamente sentimos em cima de nós a Beatriz, uma menina de tranças louras e olhos claros. 

- "Como te chamas?!" Perguntou ela apressadamente à MR. 

A Sr.ª D. MR que não vai "à bola" com estranhos assim às primeiras, encolheu-se e agarrou-se à minha perna. Respondi eu:

- "Chama-se MR. E tu?" 

- "Sou a Beatriz. Estão à espera? A minha mãe já está a ser atendida." 

Agarrei no livro que a MR me estendia e comecei a contar-lhe a história. 

- "Sabe ler?" Perguntou-me a Beatriz. 

- "Sim, sei, e tu, não sabes?" 

- "Não" 

- "Que idade tens?" 

- "Tenho sete, mas chumbei... não sabia ainda ler nem escrever.. é melhor assim, para a frente é melhor assim! Leia-me este!" 

Folheei o livro, "Beatriz este é muito complicado, é sobre o corpo humano, mais vale veres os desenhos."

Avançámos para outra estante. A Beatriz perguntou à MR: 

- "Gostas mais da mãe ou do pai?! Dos dois não é?" e riu-se.

Perguntei-lhe pela mãe. Disse-me que estava lá à frente, com um amigo. Entretanto a Beatriz começa a fazer "BU" e com movimentos bruscos a atirar os livros, segurando-os com a mão, para perto da MR. Esta assusta-se, encosta as suas costas às minhas pernas e lançando os braços para trás agarra-me. Nisto, a Beatriz agarra-lhe nos pés e levanta-os, fazendo a MR cair de rabo no chão. A MR levanta-se e salta-me para o colo. A mim saltou-me foi a tampa: 

- "Beatriz, já chega, vai ter com a tua mãe. Isso não se faz!" 

- "Desculpe, desculpe!" - A Beatriz sentou-se num canto e lá ficou com ar triste. Reparei que a mãe chorava ao balcão e que em nenhum momento desde que chegámos olhou em volta e procurou a Beatriz, que enquanto esteve connosco esteve sempre fora do seu alcance.

Entretanto fomos atendidas e antes de sair fomos dizer adeus à Beatriz. Ela levantou os olhos do chão e disse também adeus .

Assim como a Beatriz há tantas outras crianças negligenciadas, que crescem entre pais separados; com baixos rendimentos; sem atenção e consequentemente com pouco aproveitamento escolar. 

Não há muito mais para dizer. Mas há tanto por fazer...

Personagens quase invisíveis...

Estava sentada num banco de jardim. À sua volta viam-se jovens, crianças, famílias inteiras que passeavam e aproveitavam o dia de sol. Ela estava só e o seu olhar entorpecido perdia-se numa garrafa de cerveja.

Vestia-se como uma hippie. Teria 40 e tal anos, cabelo curto e calçava sandálias. Debaixo do banco, que partilhava apenas com a sua mala e um saco de supermercado, escondiam-se garrafas de bebida: duas ou três minis e uma garrafa de uma qualquer bebida espirituosa. Dentro do saco de supermercado podíamos ver gargalos e caricas que espreitavam. Sabia-se que pouco faltaria para essas também se juntarem às garrafas vazias debaixo do banco. Era só uma questão de tempo...

A forma como parecia falar com a garrafa que tinha na mão deixava perceber que aquelas não teriam sido as primeiras bebidas do dia. Estávamos no final da tarde e para si o sábado teria sido certamente muito longo...

Parecia triste, não, não bebia para se alegrar, bebia para se afundar ainda mais. Bebia porque precisava de bater bem fundo. Não se queria distrair dos seus problemas, queria recordá-los e recordá-los e continuar a recordá-los. Queria recriminar-se e sofrer pelos seus erros, por aqueles que a levaram àquela situação. Merecia-o - pensava.

E assim o mundo continuava a girar: as crianças continuavam a rir e a dar gargalhadas por tudo e por nada; os cães passeavam com os seus donos; os pais brincavam com os filhos; o benfiquista meio louco continuavam a passear-se na sua bicicleta e a ouvir a sua música e ela ali estava. Só e atormentada. E naquele sábado perfeito ninguém reparava nela, ninguém se queria incomodar, ninguém a queria ver. 

Tinha-se tornado invisível...

A Luta é Alegria

Confesso que há muito tempo que não via o Festival da Canção mas este ano, por acaso a tv estava ligada e vi os últimos 45 minutos de programa. Deu para me rir um pouco com as votações regionais - felizmente são poucas aquelas que ainda são transmitidas tendo por cenário uma cortina castanha - e depois claro resolvi ficar para ver o resultado final. O Nuno Norte parecia ser o favorito da noite e do júri, com os seus peritos das rádios locais, professores de música do ensino secundários e directores de museus, no entanto, surpresa das surpresas, o público também vota! E quando o público vota vai-se a baixo qualquer réstia de profunda análise musical e vencem aqueles que têm mais amigos em casa a telefonar ou com quem a maioria das pessoas que ainda vota nestes concursos simpatiza.

Quando me apercebi que os Homens da Luta tinham ganho nem queria acreditar, pensei logo "Que disparate! então o pessoal anda nas capitais de distrito a analisar profundamente cada uma das músicas, dá o seu voto sério e depois vem a votação de casa, tem o mesmo peso que a deles e causa uma reviravolta destas no resultado final?!?!"

Mas não é que quando ouvi a música a mesma me ficou no ouvido? A Luta é Alegria não podia ser mais apropriado ao momento e devia ser mesmo o nosso lema - apesar da crise tentar manter a boa disposição. O ritmo e a sonoridade da música podem ainda vir a trazer-nos boas surpresas na Eurovisão. Mas, mais que não seja esta canção serviu para voltar a por o nosso Festival da Canção nas bocas do mundo. Lembram-se quando não perdíamos este momento anual? E quando depois torcíamos por um bom lugar para os nossos cantores?

Soube hoje que os homens da luta se arriscam a ser proibidos de cantar na Eurovisão pois os regulamentos do concurso proíbem musicas com letra e gestos políticos.. esperemos que não obriguem a ficar de fora. É desta que ganhamos o concurso! :)

Vejam os momentos abaixo e digam-me lá que não foi memorável!


Censos 2001/2011

Chegou um dos momentos mais ansiados pelos cientistas sociais do nosso país: Censos 2011. Quando se aproxima a data até parece que custa ter que usar dados de há dez anos atrás, todos começam a ficar sequiosos de números novos, fresquinhos! A vontade de espreitar para o nosso país à luz de um retrato tirado há pouco tempo é uma ideia que fascina todos os que trabalham nestas áreas. Esperam-se ansiosamente os primeiros resultados e as novas tendências e "guidelines" para entendermos a nossa sociedade. Confesso que tenho saudades de sentir este bichinho!

Esta década o momento Censitário realiza-se à meia-noite do dia 21 de Março, é tendo por base essa hora que devem ser preenchidos todos os papéis e papelinhos ou, inovação destes Censos, submetidos os formulários via internet.

Os recenseadores já andam por aí, para além da internet a outra novidade mais flagrante são os coletes fluorescentes. Mantém as mesmas pastas e os cartões de identificação ao pescoço. Também eu, há dez anos atrás fiz parte desse grupo de pessoas que ajudou a traçar o retrato de Portugal em 2001. Foi um trabalho duro, difícil e cansativo mas muito gratificante. Partilhei trabalho com a minha amiga Calordeoutono e juntas corremos parte de uma freguesia lisboeta, juntas fizemos noitadas de contagens: quantos homens, quantas mulheres, quantas crianças, quantos edifícios... Conhecemos aquela gente e as suas casas, vivemos alguns dos seus problemas, ansiámos que alguns ainda estivessem por lá no momento da recolha dos papéis. Fomos quase insultadas e levámos repostas tortas, mas também fomos muito bem tratadas e acarinhadas por outros. Batemos à porta de alguns famosos e delirámos quando um deles nos apareceu à porta de cabelo molhado e enrolado num roupão! Devo ter corado até raiz dos cabelos!

Subimos a prédios velhos, com elevadores assustadores, encontrámos inúmeras casas vazias, escadas com madeiras podres e portas com tinta lascada que escondiam velhos que viviam sozinhos.

Para além dos números que ajudámos a recolher para o INE, para além desse retrato que tirámos ao país, tirámos também outro, um só nosso, difícil de descrever e que nos ficou gravado apenas na alma. Foi o retrato daquele bairro, daquelas pessoas e de tudo o que significaram para nós.

Hospital D. Estefânia

Mães com crianças doentes ao colo que não se inibem de ir espreitar o bebé, sem se preocuparem com os vírus que lhe podem estar a espalhar por cima:

"Tão pequenino, deve ter o quê? Um mês?"

Enfermeiros que passam o tempo a comer numa sala de banquetes que tem na porta a seguinte placa: "Enfermeira-Chefe". Ao passar ao lado já cheira a comida e a conversa de café.

Duas casas de banho, uma para o "Pessoal" e outra para os "Utentes". A dos utentes, claro está, encontra-se avariada e a do "Pessoal" trancada.

Uma janela aberta e com o trinco avariado, isto num espaço onde as crianças já estão doentes e não precisam de mais instabilidades. Outras tantas janelas que ao primeiro vento se abrem e deixam passam chuva e frio.

Auxiliares e técnicas que dão bitaites sobre tudo:

"O bebé está mesmo doentinho... farta-se de gemer."

"Ai coitadinho, está mesmo amarelinho."

"Ah! Então o bebé chora porque tem os pés frios! Olhe para isto!"

Minha senhoras... por favor... os recém-nascidos gemem muito, para além do choro é outra das suas formas de comunicar; muitos deles têm um pouco de icterícia, nada de especial. E pés frios?!?! Por mais que se tentem aquecer as extremidades, pés e mãos, é sempre difícil e não é por isso que um bebé chora!

Técnicos de laboratório que executam apenas metade dos pedidos que lhes chegam.

Médicos que dizem: "Dê-lhe um supositório Ben-U-Ron"

"Mas Dr. - diz a mãe com ar preocupado - ontem disseram-me para não lhe dar supositórios que a dose é demasiado elevada."

"Ah... mas quanto é que ele pesa?" - pergunta o médico, sem grande consciência de que essa deveria ter sido a sua primeira pergunta.

"3,750 kg, ok, dê-lhe em xarope, bem... também lhe podia dar meio supositório." - acrescenta o Sr. Dr...

Instalações frias, assustadoras e velhas...

Enfim... uma panóplia de situações, algumas caricatas, outras perversas e eventualmente perigosas para a criança.

Mas como em todas as situações temos o lado B, aquele que nos ajuda a suportar as madrugadas e tardes passadas nestes sítios: o enfermeiro simpático da triagem que nos acompanhou sempre que possível e foi demonstrando a sua disponibilidade; a médica preocupada e que não deu alta à criança apesar de a mandar para casa, já antecipando uma segunda volta e facilitando assim a entrada; o enfermeiro que enquanto se banqueteava na sala da "Enfermeira-Chefe" dizia sempre com um ar muito simpático "Espere só um pouco mãe"; os elogios à criança, feitos por todo o pessoal do hospital (que afinal até se revelou bastante simpático e acessível) "É tão perfeitinho", "Muito tranquilo", "É tão lindo", "Tem tanto cabelo!", "Parece italiano!"* e o vigilante do parque que até nos diz: "Vá, é sentido proibido mas vá agora que não vem ninguém".

Enfim, escrevo este post a pensar na nossa amiga Calordeoutono e na sua luta contínua pelo nosso Sistema Nacional de Saúde. Isto é o que temos, no seu melhor e no seu pior!


*Dizem que os homens italianos são extremamente bonitos e charmosos, portanto este comentário foi considerado elogio.