Mostrar mensagens com a etiqueta Girassóis. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Girassóis. Mostrar todas as mensagens

Música



Acredito sinceramente que possa ter sido concebida ao som de música. O meu pai era músico, era não, é - a música continua-lhe no sangue e como hobby ao qual se dedica cada vez com maior vontade. Nasci numa altura em que lá em casa ainda se respirava semanalmente música - aos fins de semana lá ia o meu pai para o seu vício e alimento. Ainda me lembro de me levar para cima do palco consigo, lembro-me da música muito alta e lembro-me que o queria só para mim, mas que numa mão estava eu e noutra o microfone.

Cresci também a ouvir música: ora os discos de vinil, ora as cassetes que o meu pai passava horas a gravar, ora as minhas músicas captadas directamente da mtv para o vídeo e do vídeo para a cassete. Tive o meu próprio gira-discos portátil, onde ouvia os meus discos, mais tarde tive o meu walkman, depois o leitor de cds e agora o ipod.

Todos os dias ouço música, todos os dias canto (é verdade que não encanto, mas como diz o meu pai, sou esforçada! A herança genética infelizmente não me contemplou com boa voz).


Sou incapaz de ouvir alguém cantar e ficar calada e o mais provável é que sofra mesmo de mimetismo musical agudo. Ah! Quando gosto de uma música sou capaz de a ouvir até à exaustão.

Ainda tentei aprender música, solfejo, orgão e viola. Mas a verdade verdadinha é que sou óptima a ouvir e a dançar, mas péssima a tocar e a cantar. Bem, mas lá por isso não deixo de tentar, bora lá:

Hey Mister D.J.
Put a record on
I wanna dance with my baby

Do you like to boogie-woogie
Do you like to boogie-woogie
Do you like to boogie-woogie
Do you like my Acid Rock

Hey Mister D.J.
Put a record on
I wanna dance with my baby
And when the music starts
I never wanna stop
It's gonna drive me crazy


Escrito para o blog Girassóis a 14/12/2009

Beijinhos

Eles faziam os trabalhos de casa na cozinha da Avó. Acompanhados da mesma que, apesar de ter apenas a 4ª classe, diploma já tirado em adulta, se esforçava por acompanhar os netos nos seus trabalhos de casa. A Avó voltou a estudar geografia e a tabuada, contas de somar, subtrair e até a prova dos nove.

Depois dos trabalhos de casa era a hora do lanche. Ela tinha uma caneca amarela, ele uma vermelha. Inevitavelmente o leite fervido estava sempre muito quente e, já misturado com o Cola-Cao, passava de caneca em caneca até arrefecer o suficiente. O leite bebia-se sempre por uma palhinha. Ora pela palhinha de cana que o avô tinha cortado e preparado para os netos, ora pela palhinha do 123 - transparente e com um formato que se ia enchendo de leite acastanhado. Acompanhava-se com uma fatia de pão com manteiga ou então, nos dias de Inverno, com uma torrada de papo-seco, cortada em três, exactamente como se via nas pastelarias.

Depois era tempo de brincadeiras. Ele adorava ir para o quintal apanhar borboletas. Pé ante pé, muito devagarinho, apanhava-as pelas asas com todo o cuidado. Ela brincava com os tachos, fazia almoços e jantares de terra e bagas vermelhas; brincava com as bonecas, vestia-as despia-as e inventava-lhes roupas novas; arranjava duas cadeiras e saltava ao elástico. Com as latas de Molico e Cerelac faziam andarilhos, brincavam com o arco vermelho (que a mãe tinha comprado no mercado) e com a Bota Botilde e o Yo-Yo.

Nas tardes de Inverno sentavam-se na camilha, a aquecer os pés na braseira e jogavam à Batalha Naval com o Avô, no seu caderno quadriculado, comprado para o efeito; jogavam ao Dominó ou às cartas. Ensinaram os Avós a jogar ao Queimps e ao Peixinho e eles tornaram-nos peritos a jogar à Bisca dos 3.

O gato "Sportíng" (o original ou já a segunda ou terceira geração de Sportings, ninguém sabe bem...) andava sempre por ali. Deitava-se de barriga para cima e adorava que lhe catassem as pulgas.

Chegava o final do dia e aparecia a mãe para os levar para casa... entravam para o banco de trás de um Renault 5, branco, e iam até à curva a enviar beijos à Avó e a perguntar à Mãe:

"Mãe, achas que é hoje que vamos esgotar os beijinhos? Porque é que eles nunca acabam? Podemos enviar todos aqueles que quisermos e continuamos sempre a ter mais?!"
Escrito para o blog Girassóis a 09/08/2009

Adolescências

Desde há uns tempos que ando com a mania de olhar para as pessoas e imaginar como eram na sua adolescência. Tenho visto casos muito engraçados! Desde o homem jeitoso, ou seja com piada, com uma ponta de charme, mas que se percebeu que enquanto adolescente tinha de certeza muitas borbulhas na cara, vê-se pelas marcas, e a quem os óculos de certeza que não ficavam tão bem como agora.

Há o outro, que mete os pés para dentro e é pouco atlético, o suficiente para imaginar uma adolescência pouco fértil em namoros. Também devia ser um miúdo estudioso, mas pouco popular e pouco ouvido pelos outros, aliás, algo que se percebe pela petulância com agora se dirige a todos. Cresceu e já ninguém goza com ele, era o que faltava, ele agora é o dono da verdade!

Há também aquele que de certeza sempre foi muito popular. Não era um miúdo giro -  era magro, alto - mas sempre praticou hipismo enquanto os outros jogavam à bola e isso tornava-o interessante. Sabia muito sobre tudo e aquilo que não sabia, descobria, estudava, empenhava-se. De certeza que em casa os pais eram demasiado exigentes e isso também se nota agora com a exigência que impõe aos outros.

Temos também aquele para quem olhamos e pensamos "de certeza que está igualzinho àquilo que era": o corte de cabelo, a maneira de estar, a insegurança e ingenuidade que demonstra, assim como a disponibilidade para ser amigo do seu amigo. O facto de continuar a ter namorada e não "mulher", até de olhos fechados, se conseguiria imputar ao facto de os pais se terem divorciado enquanto ele crescia. Foi tão difícil lidar com esse facto que se tornou inseguro e não acredita que um "papel assinado faça qualquer tipo de diferença".

Depois é muito fácil encontrar aquele que enquanto crescia era um miúdo porreiro: que gostava de computadores, de música e tinha amigas raparigas, mas que nunca teve coragem para as pedir em namoro. Hoje olhamos para ele e continua a não ser bonito, nem charmoso, mas tornou-se tão interessante que isso agora já não interessa nada...

E a verdade é mesmo essa, como é que éramos quando tínhamos 14 anos? Isso interessa para alguma coisa? Interessa apenas para justificar aquilo que somos hoje. Todas as fases da nossa vida contribuíram para nos tornar nos adultos que somos. Sim, mas se interessa para mais alguma coisa? Não, claro que não! O que lá vai, lá vai e o que interessa é aquilo em que nos tornámos, aquelas pessoas que somos hoje. Interessa saber que há mais de 15 anos atrás alguém tinha borbulhas, aparelho nos dentes e dizia "fónix" constantemente? Pois não.. só mesmo a mim, que aparentemente não tenho mais com que me entreter! :)

Escrito para o blog Girassóis a 01/03/2010

Gravata Roxa

São um casal fantástico... ele tem 78 anos, ela 75. Ela chama-se Maria Amélia e ele António José. Estão casados há 55 anos, conheceram-se, enamoram-se e casaram em 3 meses... foi uma paixão fulminante, diz ele, com um sorriso no canto da boca.

"A minha Maria Amélia trabalhava na loja "Modas d'Ouro", uma boutique fina, de senhora, na Rua Augusta, e eu tinha começado a fazer "escritas" naquele mês para o Sr. Fernando, o dono. Quando entrei na Modas d'Ouro foi ela a primeira pessoa que vi. Dirigiu-se a mim e perguntou: "Posso ajudar?" Aquele sorriso desarmou-me logo ali... ela era linda, tinha o cabelo louro, encaracolado, pelo ombro e uma silhueta de manequim (ainda hoje ela cora sempre que digo isto). Não sei bem como, no meio de toda a minha atrapalhação, lá a consegui convencer a ir comigo ao Condes no sábado seguinte, ao cinema. Bem e o resto? Uma vida cheia!"

"Ai o António José parecia um actor de cinema... era tão parecido com o Van Johnson, um actor daqueles tempos e que entrava com a Elisabete Taylor no filme que fomos ver no fim de semana a seguir a nos conhecermos. Lembro-me tão bem... vimos "A última vez que vi Paris"... enfim, já lá vão 55 anos. Mas sabe, tivemos alguns momentos menos bons, como gosto de dizer, não foram maus, foram menos bons, mas tenho sido tão feliz... que não me importava que viessem mais 55!"

Maria Amélia e António José tiveram 4 filhos e já vão em 9 netos. Ela trabalhou nas Modas d'Ouro até nascer a primeira criança, depois e felizmente ele cresceu na profissão e tornou-se num requisitado e competente "contabilista" da baixa lisboeta. Ela deixou de trabalhar e dedicou-se aos filhos, depois aos netos e sempre, sempre, a ele.

É comum ainda hoje apanharmos a Maria Amélia e o António José de "mão na mão" e em troca de olhares cúmplices. Conseguiram ao longo da vida superar os problemas que foram surgindo e até o problema de saúde, tão grave, que ele teve há dois anos os conseguiu unir ainda mais.

Fizeram votos de se amarem e respeitarem: na saúde, na doença, na riqueza e na pobreza até que a morte os separe... E foi assim com este sentido de "missão" que os "obriga" a serem felizes que caminharam a par e passo durante os últimos 55 anos.


A ela, dos tempos em que se conheceram ainda lhe reconhecemos, por defeito de profissão, o bom gosto para compor a toilette - a ele a vontade de lhe agradar.

Foi assim que hoje os encontrei, ela levava um cachecol roxo e ele, claro uma gravata roxa... caminhavam lado a lado, de braços entrelaçados...

Escrito para o blog Girassois a 21/01/2010